Magellan Taro Nakamura, 24 anos, está no Japão há dez anos e possui cidadania japonesa. Magellan trabalha há um ano na Amazon, TV Production. Os seus pais faziam documentários no Brasil e muitas vezes não estavam presentes. Foi por proposta deles que Magellan decidiu vir para o Japão. Incialmente ele havia pensado em passar apenas 3 anos estudando. A primeira escola que Magellan freqüentou funcionava como internato. |
JTB - Conte um pouco da história de seus pais.
Magellan - Meus pais são japoneses e foram como imigrantes no final de 1960. Eles foram plantar pimenta em Tomeaçu e quando juntaram dinheiro suficiente, se mudaram para São Paulo. Eles trabalhavam com documentários e vídeos institucionais. Acho que o trabalho mais significativo que meu pai fez, na minha opinião, foi o documentário com Onoda, o japonês que estava nas Filipinas e não ficou sabendo do final da guerra. Quando Onoda foi para o Brasil, meu pai se tornou seu amigo. Acho engraçado que eu, que quando criança detestava o trabalho deles, tenha acabado na mesma área.
JTB - Você veio para o Japão com 13 anos. Como foi a sua adaptação?
M - Eu não me adaptei muito bem ao sistema japonês e em um ano e meio acabei sendo expulso. Eu não conseguia falar japonês e acabava me metendo em brigas. Os alunos mais velhos achavam que eu não os tratava com o devido respeito porque eu não usava o keigo, forma polida. Os meninos tinham essa mania de se juntar para castigar os mais novos e eu para me defender andava com um bastão de aço. Eu sempre dizia para eles que eles não iriam me bater. Um dia um professor me viu com o bastão e me perguntou porque eu estava sempre com ele à tiracolo. Eu disse que se alguém tentasse me bater eu ia usá-lo. Foi por isso que acabei sendo expulso.
JTB - E depois disso?
M - Quando mudei de escola, decidi que eu iria recomeçar a minha vida. Eu fui morar em um apartamento com a minha mãe. Ela decidiu ficar no Japão e eu também fiquei para fazer um curso universitário. Eu lembro que no Brasil eu nunca fui um bom aluno. No ano em que vim para cá, eu estava para repetir o ano. Pedi aos meus professores que me ajudassem porque eu estava vindo para cá. Depois que eu entrei para essa nova escola eu comecei a estudar direitinho e acabei entrando para a Waseda.
JTB - A Universidade de Waseda é uma das mais conceituadas do país. Que curso você escolheu?
M - Decidi estudar Literatura Alemã, porque queria me tornar escritor e admirava autores como Thomas Mann. Depois que me formei, cheguei a pensar em fazer um mestrado, mas não passei nos exames. Foi quando vi um documentário sobre a Iugoslávia na televisão. A idéia que eu tinha de documentário era bem diferente. Eu imaginava os documentários como os que os meus pais faziam, mostrando belezas naturais, sabe. Aquele documentário sobre a Iugoslávia era exatamente o que eu queria fazer, só que não em texto, mas em som e imagem. Uma coisa que me chamou a atenção foi o fato de que imagem e som dependiam menos da língua do que o texto. Mesmo sem falar japonês, as pessoas poderiam entender o documentário.
JTB - E como foi o começo da sua carreira?
M - Trabalhei por um tempo em uma empresa como estagiário e depois decidi procurar um outro estúdio. A maioria dos documentários japoneses são voltados para pessoas na faixa dos 40 ou 50 anos. Eu queria falar para um público mais jovem.
Eu gostei da Amazon porque o teste que eles realizaram foi um pouco diferente das outras empresas. Eles me deram 2.000 ienes e me disseram para trazer algum resultado que eu conseguisse obter com aquela verba. Eu comprei um saquê e fui para o parque de Yoyogi. Eu me sentei com os mendigos da praça. Pedi que eles me contassem suas histórias. Eu fiz umas fotos e voltei para a empresa bêbado. O tema do teste era falar sobre a Juventude do século 20. Acabei sendo aceito.
JTB - Como é trabalhar em um ambiente de trabalho completamente japonês?
M - Para trabalhar com os japoneses é preciso aprender a maneira como eles lidam com os relacionamentos pessoais. Tudo tem dois lados. Muitas vezes eu fico pensando que deveria ter dito algo que não disse ou me arrependo de ter dito algo. Mas no meu caso, quando lido com os patrocinadores, que sempre reclamam de alguma coisa, faz parte do meu trabalho responder e apresentar a minha opinião.
JTB - Você ainda tem amigos no Brasil?
M - Ainda tenho amigos no Brasil, mas nos últimos 4 ou 5 anos tenho perdido contato.
JTB - Quais são os seus planos futuros?
M - Eu ainda pretendo voltar ao Brasil para fazer um documentário, mas meus contatos estão todos aqui. Eu conheço produtores japoneses, mas no Brasil não. Os documentários que eu via no Brasil mostravam muito a natureza, mas eu prefiro documentários mais pessoais, que mostram personagens. Eu queria mostrar a história dos imigrantes. Mais 5 ou 6 anos e eles estarão velhos demais ou mortos. Esse é um trabalho que eu quero fazer logo.
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