Meu avô. Pai de meu pai. Da época da Segunda Guerra, assim como meu pai, criança ainda. Até hoje come rápido, o meu pai. Talvez reminiscência da guerra. Odeia abóbora. Único alimento, no pós-guerra. Odeia banana. Comeu demais no Brasil e enjoou. Meu avô era jornalista. Correspondente de guerra. Relatava a brutalidade, traduzia em palavras a matança. Era alto ele, lembro-me bem. Magro, fumava feito louco. Morreu de câncer de pulmão. Nenhuma bala o atingira. Apenas a fumaça. Mas é bonita, a história de meus avós. Prestes a retornar, escreveu a última carta. Inspecionadas eram, as cartas, uma a uma. Proibia-se informações sigilosas. Mas escreveu ele, que o dia do desabrochar da flor estava próximo . É uma flor, para os budistas, que desabrocha a cada 3000 anos. Pensava que fosse 100. Conheci o pé, quando fui com meu pai. Imaginava uma árvore. Robusta, alta, magnífica. Encontrei um arbusto. Mais baixo que eu. Meio desbotado, minguando, perto de um estacionamento. Fiquei pasmo. Disseram que estava lá há milênios. Plantada no mesmo lugar, ajudando a elaborar histórias. Histórias de jornalista. Antecipando o retorno ao lar. Diz a avó que foi uma festa. A criançada, meus tios enrugados de hoje, vibrou. O pai estaria de volta. Logo logo. Mas foi bom, ter visto a planta. Não havia flores, mas não esperarei três milênios. É melhor imaginar, ficar na imaginação. Profusão de sentidos, cheiros. Minha avó esperando. A carta chegando. Meu avô chegando. Chega. É demais para mim. |